Considerado um setor que se renova e consegue manter a economia em movimento, mesmo em períodos turbulentos, o de agronegócios integra vários segmentos na economia brasileira, tanto que o país está entre os principais players mundiais. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) estimou que a agricultura e o agronegócio contribuíram com 23,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país no ano de 2017, ou seja, a maior participação em 13 anos.
Na área de fusões e aquisições, existem muitas empresas com interesse na origem de grãos – especialmente em soja e milho – e na área sucroenergética. Atualmente, há um movimento de fundos de private equity comprando distribuidoras de insumos, independente de elas originarem ou não grãos. No Estado do Mato Grosso, por exemplo, além de venderem insumos e financiarem os produtores no prazo de safra, esses fundos também originam títulos de créditos e de grãos.
Fernando Pimentel, sócio diretor da Agrosecurity Consultoria, afirma ser visível o interesse dos fundos de private equity com gestão local que estão adquirindo uma ou mais distribuidoras na região do cerrado brasileiro, principalmente. “Isso já acendeu uma luz de que realmente o mercado entende esse segmento de distribuição como uma oportunidade de aquisição”, afirmou.
Normalmente, esses fundos captam recursos no mercado doméstico, mas canalizam investimentos estrangeiros. Quando se interessam por uma empresa nacional, compram o controle do negócio e assumem a gestão financeira, estratégica e a controladoria dela. Segundo Pimentel, costumam reservar uma participação, principalmente no âmbito comercial, para os antigos controladores.
Para Renato Buranello, sócio da área de Agronegócios do Vaz, Buranello, Shingaki & Oioli (VBSO) Advogados, como agronegócios é ainda um setor que está bastante alavancado, a entrada de investimentos estrangeiros pode equacionar certos grupos, reposicionar endividamentos e dar um novo ar estratégico ao Brasil.
O advogado acredita que o setor de grãos deve ascender pela linha lógica da aquisição dos pequenos pelos médios, dos médios pelos grandes, e dos megas comprando outros megas. “Essa movimentação pode ocorrer e é o ponto de inflexão no setor”, destacou. De acordo com Buranello, deve ocorrer um intervalo ainda de alguns anos para que os segmentos sucroenergético e de grãos passem por mudanças estruturais.
O mercado de açúcar e álcool, conhecido como setor sucroenergético, também impulsiona o ambiente de negócios e pode gerar mais interesses externos nas operações e nas usinas nacionais. Nesse cenário, a RenovaBio (Política Nacional de Biocombustíveis) se insere como uma janela nova de oportunidades.
A conversão da RenovaBio em Lei (13.576/2017), no fim de dezembro de 2017, é um sinal de que o Estado passou a olhar o setor de biocombustíveis de uma forma mais sustentável. A nova política de biocombustíveis, que prevê a descarbonização do transporte, deverá impulsionar o setor no país, com o uso de combustíveis renováveis e menos poluentes.
Essa política possui regulamentação e metas setoriais que acabarão fazendo com as distribuidoras de combustíveis cumpram objetivos individuais. Assim, elas passarão a ter metas para adquirir os chamados Créditos de Descarbonização (CBios), que serão produzidos pelas empresas e usinas que produzem biocombustíveis. Isso renderá receita para as usinas que, além de venderem seus combustíveis, vão gerar os títulos CBios, e as distribuidoras terão que comprá-los para cumprir suas metas de descarbonização.
Desta forma, o RenovaBio pode movimentar operações no setor sucroenergético. Segundo Luiz Gustavo Escorcio Bezerra, sócio responsável pela área Ambiental do Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados, a tendência é de que as distribuidoras de combustíveis menores se interessem em desenvolver braços de negócios para adquirir empresas ou usinas. Assim, não ficarão reféns dos CBios que terão que adquirir de outras usinas nem estrategicamente mal posicionadas diante do RenovaBio.
Especula-se já a existência de um mercado secundário para os CBios. Bezerra disse que as distribuidoras teriam de comprá-los das usinas de etanol para cumprir as metas impostas pelo governo. Se, eventualmente, uma instituição financeira ou internacional quisesse estocar esses CBios das usinas, eles acabariam ganhando um valor de mercado.
“Por outro lado, esse mercado secundário pode impulsionar o valor dos CBios e fomentar a indústria de biocombustíveis também. Talvez as distribuidoras tenham que exercer um direito de preferência no primeiro leilão de CBios”, argumentou o sócio.
O setor de agronegócios possui uma matriz de risco e um fluxo de caixa complexos. Historicamente, é um segmento que tem uma necessidade de financiamento grande e, consequentemente, uma alavancagem considerável.
Segundo Renato Buranello, do VBSO Advogados, existem ativos interessantes estrategicamente, mas que envolvem lateralmente endividamentos de grandes proporções. A perspectiva de oportunidades é boa, porém a operação exige bastante diligência.
“É um setor endividado, não é obscuro em itens de verificação, mas envolve necessariamente uma análise mais complexa. Essas questões têm de ser olhadas com muito cuidado, porque podem mudar da água para o vinho o valor do ativo”, destacou o advogado.
Conforme Fernando Pimentel, da consultoria Agrosecurity, o setor sempre teve um fluxo de caixa e captação de recursos intensos, porque desenvolve uma atividade de médio prazo. Como no Brasil menos de 8% das áreas produtivas são seguradas, um produtor pode ter um sinistro e ficar endividado no período de um ano.
“Investidores que hoje em dia estão mais acostumados a trabalhar com isso entendem esse fluxo e já constroem estruturas de financiamento que preveem esse tipo de situação. Hoje, o crédito privado está muito mais preparado, inclusive os bancos, para trabalhar nesse ambiente de custeio do produtor, considerando as características desse mercado”, esclareceu o sócio diretor.